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Twitter de Bolsonaro na época do jornalismo Brás Cuba

Por Alan Marques


O presidente Jair Bolsonaro fala o que quer, na hora que quer e para quem ele quer em seu Twitter. Provavelmente inspirado pelo colega Donald Trump. Soma-se a isso a realidade da comunicação do Palácio do Planalto em que o espaço para o jornalista questionar, contraditar ou apurar é restrito por normas e controles. A voz mais importante da República chega primeiro pelas redes sociais.

Enquanto a mentalidade das redações e das universidades estão no século passado, a nova forma comunicativa online sem mediação (redes sociais) parece ser o mote do atual governo. Esse processo reflete, também, a tendência de convergência de meios de comunicação digital no setor privado e no terceiro setor.

Qual a novidade nisso? Nenhuma, já que o contexto da comunicação caminha cada vez mais para o online e o transmídia. Mas as reais questões são: os cursos de Jornalismo conseguem formar repórteres aptos a lidar com essa realidade? As redações estão prontas para esse novo paradigma?

Não, não conseguem. E não, não estão prontas. E, talvez por isso, há tanta perplexidade ao ver o presidente da República à frente do status quo comunicacional e da academia.

Em um passado ali na esquina, as grandes corporações controlavam o fluxo de conteúdo que chegava para o cidadão onde a TV estava em 99% dos lares. Quando, em 2014, o Jornal Nacional (Rede Globo) alcançava 71 milhões de pessoas e Jornal da Record (TV Record) 25 milhões de pessoas. Os jornais e rádios faziam parte de grandes grupos familiares com foco em agendas sem a visão nacional e com as tomadas de decisão feitas no eixo Rio-São Paulo.

Havia, e ainda há, alta concentração de informação com a redução de diversidade da abordagem dos temas relevantes da sociedade causava miopia ao não revelar de forma abrangente os problemas sociais, políticos e sociais de uma país com dimensões continentais.

Porém, mudou muito o contexto comunicacional em um espaço curto de tempo. Onde no agora, vê-se de forma disseminada o consumo e a produção de conteúdo quase que instantaneamente nos smartphones do cidadão comum. É aí que Jair Bolsonaro fala diretamente para o cidadão comum sem os filtros de checagem existentes no processo jornalístico.

Outro exemplo atual fora do cenário política, a trágica morte de Ricardo Boechat, nesta semana, foi primeiramente reportada pelo cidadão comum que registrou o fato in loco para consumo imediato nas redes sociais.

Entre tantas, a dramática imagem de uma mulher tentando abrir a porta do caminhão, que bateu no helicóptero onde estava Boechat, é emblemática. Além do ato heroico da cidadã, na foto era possível ver grupo de pessoas mais preocupadas em fazer vídeos e fotografias do acidente do que ajudá-la a resgatar o motorista.

Por fim, o jornalismo, em seu espaço profissional e acadêmico, não pode mais divagar na produção de “emplastos” e morrer de pneumonia. Caso não se entenda a mudança de paradigma do processo de mediação, o repórter vai repetir o que foram as últimas palavras de Brás Cubas: “Não tive filho e não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”.

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